Ano: 1840

Segundo Reinado

Pedro II, nascido no Rio de Janeiro em 1825, filho mais novo do imperador Pedro I do Brasil e da imperatriz Maria Leopoldina da Áustria. Pertencente à Casa de Bragança, ascendeu ao posto de Imperador do Brasil em 23 de julho de 1840. A partir do episódio conhecido como Golpe da Maioridade, Dom Pedro II iniciou o Segundo Reinado e se manteve no poder até a Proclamação da República, em 1889, constituindo-se como o último representante da família real portuguesa em exercício no Brasil.

O Golpe da Maioridade aconteceu em um ambiente de diversos conflitos entre liberais e conservadores. Por um lado, as revoltas regenciais questionaram a centralização política e o controle monárquico. Por outro, os regentes em exercício até 1840 buscaram manter o poder e negociar as insatisfações provinciais, que se desdobravam em movimentos de cunho federalista, revoltas escravas e das elites políticas e econômicas em busca de maior autonomia.


Pedro II do Brasil. Mathew Brady – Esta imagem está disponível na Divisão de Gravuras e Fotografias da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos com o número de identificação digital cwpbh.04006. Pedro II of Brazil. Library of Congress description: “Pedro, D. of Brazil (1876)”.
Domínio Público.

Conforme explica Boris Fausto (2006), foram os liberais, e não os conservadores, que precipitaram a chegada de Pedro II ao poder. O contexto desenrolou-se em meio às medidas de regresso da centralização do poder, promovidas na última Regência Una de Araújo Lima.

Os liberais, inconformados com aquelas medidas, articularam o Clube da Maioridade e promoveram no Congresso a antecipação da maioridade do rei, por meio de uma interpretação arranjada do Ato Adicional de 1834 (FAUSTO, 2006, p. 175).

De acordo com Lilia Schwarcz (1998), a articulação para a ascensão de Pedro II foi o reflexo dos anseios de uma elite carioca que lograram manter-se ativos mesmo com o impulso descentralizador das Regências. Esse grupo voltou-se para o princípio monárquico como forma de “salvar a nação” (p. 98).

A vitória da Monarquia sobre qualquer forma de República ou de expansão das ideias políticas liberalistas confirmou-se com a coroação de Pedro II. Segundo Schwarcz, no ritual, ocorrido em julho de 1841, ficaram evidentes as intenções de conferir e consolidar a importância do Estado monárquico.

“A corte, vestida com o máximo rigor, aguardava pelo maior ritual já preparado no país. Sempre se dissera que d. Pedro deveria reinar como seu parente Luís Filipe de Orléans, que ao se aliar à burguesia e jurar a Constituição ficou conhecido como um monarca-cidadão. Mas a sagração estava mais para o modelo napoleônico, ou era antes uma recuperação dos mais requintados rituais das monarquias europeias do que uma exaltação de “modernidade”.” (SCHWARCZ, 1998, p. 100)

As primeiras medidas do jovem imperador foram (re)centralizar o aparelho administrativo e assegurar a unidade de seu governo frente às insatisfações regionais. Por isso, de acordo com Lilia Schwarcz, o período entre 1841 e 1864 — que marca o início da Guerra do Paraguai — representa uma fase importante para a consolidação da monarquia brasileira (1998, p. 118).

Esse processo foi marcado pelo aprofundamento de um sistema de monarquia parlamentar bastante peculiar e restrito que, na prática, se revelava um “parlamentarismo às avessas”. Em linhas gerais, esse sistema político era formado pelo Poder Executivo, composto pelo Imperador, que gozava da restauração do chamado “Poder Moderador”, pelo Conselho de Estado e, mais tarde, pelo Conselho dos Ministros (FAUSTO, 2006, p. 179).

O Poder Moderador já havia sido instituído pela primeira Constituição Brasileira, outorgada por Dom Pedro I, em 1834. Nela, também se criou o sistema que continuou vigente durante o Segundo Reinado, com uma clara separação dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. No entanto, o Poder Moderador foi o elemento peculiar e crucial para o aprofundamento da centralização política, em detrimento da existência dos outros poderes.

Conforme explica Boris Fausto, na formação do Conselho de Ministros, por exemplo, “o imperador usava as prerrogativas do Poder Moderador, quando a Câmara não apoiava o gabinete de sua preferência. Nesse caso, com base no Poder Moderador, dissolvia a Câmara, após ouvir o Conselho de Estado, e convocava novas eleições. Como nas eleições o peso do governo era muito grande, o imperador conseguia eleger uma Câmara que se harmonizava com o gabinete por ele preferido” (2006, p. 179-180).

Detendo o Poder Moderador, Pedro II governou durante cinquenta anos. Seu poder de decisão, que violava a teoria de equilíbrio entre os poderes preconizada por Montesquieu e defendida por parte dos liberais no Brasil, constituiu uma espécie de “parlamentarismo de fachada” que permitia o rodízio, sob a chancela do imperador, de conservadores e liberais nas esferas legislativas. Ao revezarem-se no poder, ambos os grupos reduziram suas insatisfações e minimizaram as disputas políticas, conformando, ao menos até 1870, uma base de apoio significativa às decisões do imperador.

O restabelecimento do Conselho de Estado, em novembro de 1841, também representou uma medida de centralização do poder. Segundo Maria Fernanda Martins, esse Conselho seguiu o modelo dos “conselhos áulicos europeus, as assembleias de notáveis com membros vitalícios”, revelando-se um instrumento para a prática político-administrativa vinculada a uma tradição europeia do Antigo Regime. Sua função primordial foi auxiliar a monarquia e exercer o papel de árbitro em conflitos e conciliar interesses, mediando as relações da Coroa com os grupos políticos e com as autoridades regionais e locais.

O Conselho foi estabelecido no Brasil em 1823, após a Independência, quando Pedro I criou um órgão composto por dez membros, além dos ministros, considerados conselheiros natos, cuja função primordial era vencer os impasses políticos e apresentar uma carta constitucional.

O restabelecimento do Conselho em 1841, no entanto, definiu que o órgão seria presidido pelo Imperador e composto por 12 conselheiros ordinários e até 12 extraordinários, além dos ministros de Estado (MAPA). Em linhas gerais, o Conselho seria consultado sempre que o Poder Moderador fosse acionado pelo Imperador. Suas atribuições foram ampliadas em relação a 1824, e, por isso, sua estrutura organizou-se em quatro seções: Justiça e Estrangeiros, Império, Fazenda e Marinha e Guerra.

“O Conselho assumiu, ao longo do Segundo Reinado (1840-1889), o papel que lhe fora atribuído pela elite política, de constituir-se como mantenedor do regime constitucional, fiador da ordem e da integridade do Império. Ao órgão coube a função de propor e interpretar as leis do Estado, bem como assegurar o seu cumprimento. […] Como instância mediadora do exercício do Poder Moderador, a atuação do órgão se estendeu pelos outros poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – e, em especial, na administração provincial. Profundamente adequada aos interesses do Estado, a atuação do Conselho permitiu-lhe fazer ingerências em diferentes áreas de governo, o que acabou por torná-lo, ao lado do Poder Moderador, objeto de duras críticas à centralização e controle exercido pelo governo imperial, especialmente sobre os governos locais”.

Nos primeiros anos do Segundo Reinado, também houve mudanças no sistema Judiciário. De acordo com Fausto (2006), criou-se, em cada capital de província, um cargo de chefe de polícia, que deveria ser nomeado pelo ministro de Justiça. Foram, ainda, criados os postos de delegado e subdelegado nas paróquias e municípios. Essas primeiras medidas revelavam a estratégia do novo Imperador em controlar as dissidências e os conflitos regionais.

Nesses primeiros anos, a reforma da Guarda Nacional aprofundou a centralização política e reforçou a figura do imperador. Os oficiais passaram a ser escolhidos pelo governo central e pelos presidentes de província. Assim, a Guarda Nacional teve também modificadas suas funções, já que deveria manter a ordem e a defesa dos grupos dominantes em nível local, enquanto ao Exército caberia as funções de “arbitrar disputas, garantir as fronteiras e manter a estabilidade geral do país” (FAUSTO, 2006, p. 176).

Apesar das medidas de centralização administrativa e política, os primeiros anos do Segundo Reinado foram marcados pela desagregação social e pela falta de uma base de apoio sólida ao novo governo. Logo em 1842, surgiram revoltas liberais nas províncias de São Paulo e Minas Gerais, nas quais figuravam líderes importantes, como Padre Feijó, Campos Vergueiro, Limpo de Abreu e Teófilo Ottoni. Além disso, em 1848, teve início a Revolução Praieira, em Pernambuco, um conflito deflagrado por homens da província, em sua maioria gente urbana e senhores de engenho ligados ao Partido Liberal, que haviam perdido o controle da província para os conservadores.

Apesar das disputas políticas entre liberais e conservadores, os grupos não defenderam ferrenhamente suas “ideologias”. Os conflitos nas esferas institucionais e públicas refletiam muito mais a defesa dos interesses privados e econômicos desses grupos do que propriamente a defesa de causas nacionais e coletivas (FAUSTO, 2006, p. 181).

“Chegar ao poder significava obter prestígio e benefícios para si próprio e sua gente. Nas eleições não se esperava que o candidato cumprisse bandeiras programáticas, mas as promessas feitas a seus partidários. Conservadores e liberais utilizavam-se dos mesmos recursos para lograr vitórias eleitorais, concedendo favores aos amigos e empregando a violência com relação aos indecisos e adversários” (idem, ibidem).

Apesar dos entraves políticos dos primeiros anos, o Segundo Reinado foi palco de uma série de transformações. A partir da década de 1850, com a consolidação de Pedro II no poder, verificou-se um significativo avanço em áreas específicas, como a infraestrutura e os transportes, o que contribuiu para o desenvolvimento da economia capitalista no país.

Algumas transformações na esfera legal foram cruciais para viabilizar esse processo. A primeira delas foi a decretação da Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850, conhecida como Lei Eusébio de Queirós, que estabeleceu medidas para a repressão do tráfico de africanos no Império (MAPA, 2016).

Apesar de esta lei ter feito parte de um processo lento e paulatino de abolição numa sociedade conservadora, cujas relações ainda eram pautadas pelo escravismo, a proibição do tráfico permitiu a incorporação de novas formas de trabalho no Brasil. Vinculada a pressões internacionais, a Lei Eusébio de Queirós suscitou inúmeras críticas entre senhores de escravos, proprietários de fazendas de café e elites urbanas. Não impediu, porém, que a mão de obra escrava continuasse sendo comercializada internamente e utilizada tanto na esfera rural como urbana. Para saber mais sobre a escravidão durante o período colonial, clique aqui.

A Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, sobre as terras devolutas do Império, também foi um dispositivo legal que suscitou transformações na estrutura econômica do país. Pela primeira vez, uma lei buscou regulamentar a questão fundiária e a propriedade privada no país. “Esse ato determinou que a única forma de acesso às terras devolutas da nação fosse através da compra ao Estado em hasta pública, garantindo, entretanto, a revalidação das antigas sesmarias, que era até então a forma de doação da terra por parte do Estado à iniciativa particular – prática existente desde os tempos coloniais – e das posses realizadas até aquele momento, desde que estas tivessem sido feitas de forma mansa e pacífica” (MAPA, 2016).

Soma-se, a essas medidas, a instituição do Código Comercial, de junho de 1850, que regulamentou as atividades do livre comércio, estabelecendo medidas de permissão e controle, além de diretrizes contábeis para a atividade.

“Esboçavam-se assim, nas áreas mais dinâmicas do país, mudanças no sentido de uma modernização capitalista, ou seja, nasciam as primeiras tentativas para se criar um mercado de trabalho, da terra e dos recursos disponíveis” (FAUSTO, 2006, 197).

No que se refere ao desenvolvimento da infraestrutura e dos transportes durante o Segundo Reinado, o marco legal fundamental foi o Decreto nº 641, de 1852, que concedeu privilégio de zona às empresas ou pessoas dispostas a construir estradas de ferro entre o Rio de Janeiro e regiões favoráveis para escoamento de mercadorias e trânsito de pessoas nas províncias de São Paulo e Minas Gerais. Em outras palavras, o privilégio de zona proibia outras empresas de construir ferrovias a menos de 30 km de cada lado da linha já construída (idem, p. 198).

Vale destacar que o decreto previu o ganho de até 5% de juros sobre o capital empregado na construção das linhas para as empresas privadas. Além disso, concedeu o direito de desapropriar “o terreno de domínio particular” necessário para o “leito do caminho de ferro, estações, armazéns e mais obras adjacentes” (Decreto 641 apud JURUÁ, 2012, p. 200).


Estrada de Ferro do Recife ao São Francisco: construção. Ano 1858-1860. Acervo Digital da Biblioteca Nacional.

Para Boris Fausto, a medida evidenciou a ideia predominante durante o Segundo Reinado: a modernização do país só seria impulsionada se o precário sistema de transportes passasse por melhorias. Não à toa, segundo Ceci Juruá, o Decreto nº 641 tem sido considerado, pelos estudiosos do tema, o marco jurídico fundador do programa ferroviário brasileiro (2012, p. 75).

As iniciativas do governo de Pedro II surtiram efeitos e atraíram não apenas investimentos, mas foram o alicerce que permitiu o início de uma das eras de maior desenvolvimento econômico e industrial do país: a Era Mauá. Durante esse período, foram construídas importantes obras na área dos transportes, como o Estaleiro Mauá, em Niterói; a primeira ferrovia do país, a Estrada de Ferro Mauá, inaugurada por Pedro II, em 1854 (ressalva-se o fato de que essa ferrovia não foi contemplada com as benesses do Decreto nº 641/1852), e a São Paulo Railway, entre Santos e Jundiaí, que começou a ser construída em 1867. Para saber mais sobre a Era Mauá, clique aqui!

O “surto ferroviário” da segunda metade do século XIX fez nascer seis ferrovias consideradas pioneiras pela pesquisadora Ceci Juruá. Na Região Sudeste, destaca-se a inauguração de quatro ferrovias. Três delas ligavam a capital do Império a outras localidades, a saber: a já citada Estrada de Ferro Mauá, com 14,5 km de extensão, que ligava o fundo da Baía da Guanabara à localidade de Raiz da Serra, em direção à cidade de Petrópolis.

A segunda foi a Estrada de Ferro D. Pedro II, com inauguração do trecho inicial, entre o Campo de Santana e Belém, atual Japeri, em 1858. A terceira, inaugurada em abril de 1860, foi a Estrada de Ferro de Cantagalo, linha férrea entre Porto das Caixas e a Raiz da Serra de Friburgo. Ainda na Região Sudeste, destaca-se a construção da Estrada de Ferro Santos-Jundiaí (São Paulo Railway Company), inaugurada em fevereiro de 1867, que logrou transpor a grande barreira da Serra do Mar (JURUÁ, p. 80).


Estrada de Ferro D. Pedro II: Estação Central: Campo d’Acclamação. Imprenta, Rio de Janeiro, RJ: [s.n.], 1881.

No Nordeste, foram construídas a Estrada de Ferro Recife ao São Francisco (Recife & São Francisco Railway Company), inaugurada em fevereiro de 1858, e a Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco – EFBSF (Bahia & São Francisco Railway Company), que deveria ligar Salvador a Juazeiro. A primeira seção dessa ferrovia, que ia de Calçada até Paripe – bairros da cidade de Salvador –, foi inaugurada em junho de 1860 (idem, ibidem).

Em 1867, as seis ferrovias somavam cerca de 651,4 km abertos ao tráfego de pessoas e mercadorias. Segundo Juruá, as receitas gerais eram de 5.615 contos de réis, e as despesas gerais atingiam 2.881 contos de réis (2012, p. 81).

No entanto, de acordo com levantamento feito pelo Ministério da Infraestrutura, durante a vigência do Decreto 641/1852, ou seja, entre 1852 e 1875, foram construídos 1.128 quilômetros de ferrovias, resultado considerado modesto para as necessidades do país, à época (MINFRA).

Para resolver a questão, um novo marco legal foi sancionado em 1874, o Decreto nº 2.450, que alterou o anterior. A principal mudança instituída era a concessão de subvenção por quilômetro de ferrovia construída ou garantia de juros de até 7% do capital empregado pelo prazo de 30 anos.

“Da totalidade das ferrovias do Segundo Reinado, cerca de 90% foram construídas depois de 1873, ano que foram concedidos mais amplos favores aos concessionários. Em dezembro de 1873, tínhamos 10 linhas férreas e, em 1889, nada menos que 58. Ainda assim, em 1889, havia ainda seis províncias aonde as ferrovias não chegaram: Amazonas, Maranhão, Piauí, Sergipe, Goiás e Mato Grosso” (MINFRA).

Nesse período, merecem destaque ferrovias regionais, como a Estrada de Ferro Sorocabana e a Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, que entraram em operação no ano de 1875 e ligaram diferentes pontos do interior do Estado de São Paulo, viabilizando o transporte mais eficiente de café e de pessoas.

No Nordeste, a Bahia ficou com o protagonismo no desenvolvimento ferroviário dessas décadas. Inaugurou-se a Estrada de Ferro Central da Bahia: em 1875 e foi aberto ao tráfego o primeiro ramal, o de Feira de Santana. Em 1877, foi concluída a linha principal, a de São Félix — em frente a Cachoeira, no rio Paraguaçu — até Bandeira de Mello, a 254,3 km (SANTURIAN, 1991). Em 1880, inaugurou-se a Estrada de Ferro Santo Amaro, construída a partir da região açucareira da cidade de Santo Amaro, no Recôncavo Baiano, e passava por Buranhém, prolongando-se até Catuiçara.

No Sul, vale destacar a construção de três ferrovias. Uma delas foi a Paranaguá-Curitiba, inaugurada em 1883, e “que se constituiu um marco de excelência da engenharia ferroviária brasileira, considerado, à época, por muitos técnicos europeus, como irrealizável. A sua construção durou menos de 5 anos, apesar das dificuldades enfrentadas nos seus 110 km de extensão. Em 17 de novembro de 1883, foi inaugurado para tráfego regular o trecho Paranaguá-Morretes. Ao trecho pioneiro da ferrovia juntaram-se outras interligações que possibilitaram o progresso dos atuais estados do Paraná e Santa Catarina” (DNIT).

Já em 1884, foram inauguradas a Estrada de Ferro Porto Alegre a Novo Hamburgo e, em Santa Catarina, a Estrada de Ferro Donna Tereza Christina. Pioneira na província, esta última tinha extensão de 112 km e foi o resultado de uma concessão obtida pelo Visconde de Barbacena, com o objetivo de viabilizar o transporte de carvão de pedra das minas para o Porto de Imbituba (DNIT).

Apesar de não receber o mesmo tratamento das ferrovias, a infraestrutura de transportes terrestres rodoviários também avançou em termos de modernização e urbanização. Em 1861, entrou em operação a primeira rodovia macadamizada do continente, a Estrada União e Indústria. O trecho ligava as cidades de Petrópolis e Juiz de Fora, com 144 km de extensão, e foi inaugurado por Pedro II em 23 de junho de 1861.


Klumb, Revert Henry, ca. 1826-ca. 1886. Estrada União e Indústria, Brasil. Entrée du Valle du Pyabanha (pris du Pont du Retiro). 1860.

Apesar do protagonismo da Estrada União e Indústria, consta que a primeira estrada de rodagem do país foi inaugurada no interior de Minas Gerais, em 1857, com cerca de 170 km. O trecho ligava Santa Clara a Filadélfia, freguesia que posteriormente seria elevada à condição de cidade e receberia o nome de Teófilo Otoni.

Conhecida por ser a “via Ápia do Mucuri”, por essa rodovia trafegavam, em 1859, “mais de 40 carros particulares puxados por bestas, 200 carros de boi e 400 lotes de burros” (IBGE). O traçado dessa rota, posteriormente, conformaria a BR 418, que, na atualidade, liga as cidades de Teófilo Otoni a Nanuque, no Vale do Mucuri, região do nordeste mineiro (PORTO, 2007).

Uma informação importante sobre a Estrada Santa Clara-Filadélfia é que ela foi construída para viabilizar o escoamento de mercadorias pelo rio Mucuri. O projeto da estrada foi viabilizado por Teófilo Benedito Ottoni, fundador da Companha de Comércio e Navegação do Mucuri, que detinha o capital para explorar tanto a navegação como o transporte terrestre de cargas e pessoas pela região. Além disso, Ottoni necessitava vincular o transporte terrestre ao marítimo, visto que os armazéns da Companhia ficavam nas regiões de Filadélfia e Santa Clara (idem, ibidem).

A estrada “começava na cachoeira de mesmo nome do Rio Mucuri, na divisa de Minas com a Bahia, e tomava o rumo oeste praticamente no mesmo paralelo até a localidade de Filadélfia, hoje cidade de Teófilo Otoni” (PORTO, 2007). Assim, na impossibilidade de trazer o mar até as Minas Gerais, Ottoni construiu um porto fluvial e, dele, uma estrada capaz de viabilizar o comércio e o armazenamento de mercadorias.

Em 1873, inaugurou-se a Estrada Dona Francisca, em Santa Catarina, ligando Joinville a São Bento. Também conhecida como Estrada da Erva-Mate, nome que aludia ao principal produto transportado por ela, à época, o caminho era perfeitamente transposto por carroças, tornando o transporte mais eficiente e ágil.

No mesmo ano, abriu-se para o tráfego a Estrada Graciosa, ligando Antonina a Curitiba. Apesar de ter sido estabelecida sobre uma rota antiga, utilizada desde o início da colonização para ir do litoral ao altiplano, a estrada foi melhorada para permitir o tráfego de veículos com tração animal e abarcou um trecho de 94 quilômetros (MINFRA).

Sobre a infraestrutura portuária, a partir do levantamento feito pelo Ministério da Infraestrutura, constata-se não ter recebido grande impulso durante o Segundo Reinado. Não obstante a navegação de longo percurso, de cabotagem e fluvial terem sido favorecidas pela expansão econômica, a estrutura dos principais portos do Brasil permanecia basicamente a mesma do período colonial.

Vale destacar, contudo, o Decreto nº 1.746, de 1869, que autorizou o governo a contratar a construção de armazéns e docas para carga, descarga, guarda e conservação de mercadorias de importação e exportação, nos diferentes portos do Império.

A partir desse decreto, foi concedido ao Conde da Estrela e ao Doutor Andrade Pertence o privilégio de explorar o porto de Santos por 90 anos. As reformas no porto começaram em 1872, depois da aprovação do projeto do engenheiro R. P. Bereton para a construção de um cais de 3 mil pés de comprimento ao longo do canal, uma ponta de atracação e uma bacia de flutuação para navios com calado de até 18 pés (MINFRA).


Marc Ferrez, Porto de Santos. 1870. Domínio Público.

As transformações experimentadas no campo da infraestrutura e dos transportes acompanharam também o desenvolvimento da economia capitalista no país. Apesar da permanência do sistema escravocrata até 1888, uma nova lógica de produção, trabalho e consumo foi se constituindo durante o Segundo Reinado.

Do ponto de vista produtivo, a agricultura continuava sendo a principal atividade econômica do país, mas a expansão das lavouras de café fomentou a urbanização e o crescimento das relações comerciais interprovinciais e entre províncias das Regiões Sul e Sudeste. Além disso, favoreceu a construção das ferrovias e de vias mais eficazes para o transporte de produtos e pessoas. No Nordeste, o açúcar e o algodão eram os principais produtos, enquanto no Sul predominavam atividades como a pecuária e a produção de carne e couro.

A livre navegação e a comercialização promoveram maior circulação de mercadorias no mercado interno e o surgimento de hábitos de consumo numa elite influenciada pela Corte, sobretudo no Rio de Janeiro. Além disso, a migração e o emprego de novas relações de trabalho, em fazendas do interior de São Paulo, começaram a desenhar particularidades do trabalho livre num país ainda timbrado pela escravidão.

Durante o Segundo Reinado, foram implementadas mudanças importantes no campo da urbanidade, saneamento básico, educação, artes e ciência, ainda que a maioria estivesse concentrada no Rio de Janeiro e em São Paulo. Em ambas as cidades, surgiram carruagens e bondes puxados por tração animal para viabilizar a locomoção da população, e o sistema de iluminação pública a gás começou a funcionar. Em várias capitais do país, foram construídos teatros e espaços de entretenimento. No Rio de Janeiro, foi criada, com o apoio de Pedro II, a Imperial Academia de Música e Ópera Nacional.

O Segundo Reinado experimentou um pujante momento no campo da literatura, com importantes obras voltadas a questões políticas, contradições na construção da nação, divergências sociais e etnicidades. Algumas correntes literárias destacam-se nesse contexto, como o Romantismo, cujas características incluem, além do sentimentalismo exacerbado, o nacionalismo e o culto à natureza. Dentre seus principais expoentes, está José de Alencar, que, em 1857, publicou a célebre obra “O Guarani”, valorizando o indígena como herói nacional e o lugar da miscigenação na história brasileira. Outros autores do período foram os poetas Gonçalves Dias e Castro Alves, e os romancistas Joaquim Manuel de Macedo (A Moreninha) e Manuel Antônio de Almeida (Memórias de um Sargento de Milícias).

Já as obras do Realismo primavam pelo teor político mais acentuado, pela crítica à burguesia e às desigualdades sociais. Uma das mais notáveis e considerada como obra inaugural do Realismo no Brasil é Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Quanto ao Naturalismo – corrente literária encetada pela publicação da obra O Mulato, de Aluísio de Azevedo –, teve forte influência do evolucionismo, do cientificismo e da ideologia positivista, além de se debruçar sobre problemas sociais e humanos, como racismo e preconceito.

A partir da década de 1870, o Segundo Reinado entrou em sua fase de declínio. Seu fim está relacionado a uma série de fatores, como os impactos da Guerra do Paraguai (1864-1870), o primeiro grande conflito armado externo em que o Brasil se envolveu. O conflito uniu Brasil, Uruguai e Argentina (Tríplice Aliança) contra o Paraguai, numa disputa por fronteiras e por vias de navegação na Bacia do Prata. Após a Guerra e com a vitória da Tríplice Aliança, muitos oficiais brasileiros passaram a ocupar posições diferentes também na área política, e os desentendimentos com o Império se aprofundaram (FAUSTO, p. 223).

A queda da monarquia também está relacionada com as tensões entre o Império e a Igreja Católica, causadas pelas interferências de Pedro II nas doutrinas religiosas, visto que o imperador podia conceder ou negar validade a decretos eclesiásticos (FAUSTO, p. 229).

O enfraquecimento monárquico foi marcado, ainda, pela ascensão de um movimento republicano que começara a ganhar corpo a partir da década de 1870, cujos representantes se dividiam em tendências conservadoras e liberais.

Não menos importante, o tema da Abolição também foi fundamental para desgastar o regime. De um lado, as iniciativas do imperador no sentido de extinguir gradualmente o sistema escravista provocaram fortes ressentimentos entre proprietários rurais (FAUSTO, 2006, p. 236). De outro, o crescente movimento abolicionista promovia um debate público criticando a morosidade para o fim definitivo da escravidão.

Boris Fausto defende, todavia, que as causas fundamentais do sepultamento do Império foram as articulações do Clube Militar e da burguesia cafeeira paulista que compunha o Partido Republicano Paulista, fundado em 1873 (2006, p. 236). Tais grupos, apesar de conservadores, encontraram ressonância nas insatisfações sociais, militares, além da crescente propaganda republicana, que contribuía para exaltar os ânimos contrários ao Império.

Em 15 de novembro de 1889, figuras civis e militares, como Benjamin Constant, Rui Barbosa, Aristides Lobo e Quintino Bocaiuva impulsionaram a elevação do Marechal Deodoro da Fonseca como líder da República. Num processo resultado da “disputa entre elites divergentes” (FAUSTO, 2006, p. 236), a ascensão da República colocou no poder líderes conservadores, que pouco alteraram a estrutura econômica e organizacional do Império.

Inaugurava-se, então, a chamada “Primeira República”, delimitada, em seus primeiros anos, pela incerteza política e administrativa, mas dominada, nas décadas seguintes, pelas oligarquias rurais do Sudeste e Sul do Brasil.

Referências bibliográficas:

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Legislação Informatizada Decreto nº 2.450, de 24 de setembro de 1873 — Publicação Original.

CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem. Brasília: Editora da UNB, 1980.

DNIT. Histórico. s/d.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo, Edusp: 2006.

IBGE. Teófilo Otoni. Catálogo.

JURUÁ, Ceci Vieira. Estado e construção ferroviária: quinze anos decisivos para a economia brasileira, 1852-1867. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: UERJ, 2012.

MARTINS, Maria Fernanda Vieira. O Conselho de Estado no Segundo Reinado. Rede Memória. Biblioteca Nacional.

MEMÓRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA (MAPA). Conselho de Estado. 11 de novembro de 2016.

__________________________________________________. Lei de Terras. 11 de novembro de 2016.

__________________________________________________. Lei Eusébio de Queirós. 11 de setembro de 2016.

MINISTÉRIO DA INFRAESTRUTURA (MINFRA). Transportes no Brasil – Síntese História. 23 de outubro de 2014.

PORTO, Gilberto Otoni. “1857-2007: 150 anos da primeira estrada de rodagem do Brasil”. Jornal da AFATO, maio de 2007.

SANTURIAN, Alexandre. As ferrovias da Bahia. Estrada de Ferro Central da Bahia. Julho de 1991.

SCHWARCZ, L. M. As barbas do imperador: Dom Pedro II, um monarca nos trópicos. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras. 1998