Revendo substantivamente o cenário macroeconômico brasileiro e global

Na ausência de bola de cristal, o economista faz o seu melhor para, pelo menos, acertar a direção e as tendências. Por vezes, as crises adquirem dimensões tão relevantes que fogem ao alcance dos modelos de previsão por mais sofisticados que sejam, sobretudo quando há crises de confiança. Não existem manuais ou receitas de bolo para superar uma crise de confiança que talvez pudesse ter sido evitada caso não tivesse ocorrido a quebra da Lehman Brothers no mês de setembro. Contar a história contrafactual é impossível e nos resta olhar para frente tentando compreender a dimensão, a profundidade e a duração da crise global e de suas repercussões sobre o Brasil.

Há certeza de que o mundo pisa bruscamente no freio devido à chamada desalavancagem e à notável redução do papel do crédito nas economias. Ninguém mais se interroga se haverá recessão em economias desenvolvidas e já há um consenso de que o PIB americano de 2009 e de vários países europeus será inequivocamente negativo. Portanto, nossa leitura é a de que a surpresa marginal é decrescente do ponto de vista de atividade econômica global. Assim, é forte a intuição de que cenas de pânico explícito, como a que assistimos algumas vezes nos últimos meses, não serão mais freqüentes. Ou seja, volatilidade excessiva está longe de ter acabado, mas os atores econômicos globais já reconheceram que a inequívoca determinação das autoridades governamentais de dezenas de países no sentido de evitar que a recessão já contratada se transforme em uma depressão como nos anos 30.

Estamos prevendo um crescimento global de 1,8%, contra 3,6% em 2008. É razoável supor que mundo crescerá durante uns 3 anos abaixo de sua média histórica que, por coincidência, é de 3,6%. Para a China, trabalhamos com 7% de crescimento, sendo uma das mais baixas projeções do mercado hoje. Acreditamos que o preço das commodities, depois das fortes quedas, se acomodará em níveis de janeiro de 2007 e trabalhamos com o preço médio do petróleo a US$ 59 por barril.

Quanto à economia brasileira, apesar de continuarmos insistindo na tese de que sua capacidade de resistência é infinitamente superior à que exibia no passado de outras crises, estamos agora trabalhando com um crescimento de apenas 2,5% em 2009 e de 3,5% em 2010. É claro que muita água ainda vai rolar e, a despeito da desalavancagem do crédito global, pode ser que restauremos a confiança dos mercados, sobretudo nos Estados Unidos, agora com um novo governo de grande credibilidade. Mas o Brasil não escapará de crescer um par de anos abaixo de seu potencial que, grosseiramente, gira em torno de 4,5% hoje. Os investimentos sentirão um pouco mais (custo do capital mais alto implica em revisão da taxa de retorno dos projetos) do que o consumo das famílias. O mercado de trabalho, mesmo desacelerando bastante na criação líquida de empregos, segurará bem a onda do consumo que cairá menos em 2009.

Achamos que o governo brasileiro continuará agindo de forma contracíclica, reduzindo 0 superávit primário para 2,8% do PIB (vindo de 4,3%) e que, apesar disso, os juros iniciarão sua trajetória de queda no segundo trimestre de 2009 quando a inflação projetada 12 meses à frente estará abaixo da meta de 4,5%. Quanto à taxa de câmbio, as condições globais de financiamento externo se alteraram substantivamente com a aversão ao risco e, por isso, revisamos para um câmbio médio de R$ 2,29 em 2009. fechando o ano em R$ 2,20.

Por mais pessimista que possa parecer esse cenário, ousamos dizer que não é tanto. O Brasil está bastante bem posicionado para o dia seguinte da crise, mesmo se não sabemos quando será. Parece-nos que o preço de seus ativos está, neste momento, subestimado.

Autoria: Octavio Manoel Rodrigues de Barros *

Data: 01 de dezembro de 2008

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(*) Doutoramento pela Universidade de Paris XNanterre. Foi assessor do Ministério da Fazenda, economista convidado do BACEN, Presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo, visiting-fellow do Centro de Desenvolvimento da OCDE, chefe de operações financeiras internacionais da CESP e diretor de economia da FEBRABAN. É membro do Conselho de Economia da FIESP e diretor de pesquisas econômicas do Bradesco.