A Criação do Sindicato e o Problema da Unidade Sindical

Há uns oito anos, um velho radiotelegrafista levantou a questão da importância de ser criado um Sindicato único de radiotelegrafistas, que agrupasse todos êsses profissionais em todo o território nacional, fôssem do mar, de terra ou do ar. Esta tese parecia justa, por isso, assim colocada, logo ganhou a simpatia e apoio de alguns companheiros. Acontece que a sistemática sindical brasileira enquadra os trabalhadores das diversas profissões e os empregadores em sindicatos, de acôrdo com um setor económico específico, dentro da economia geral do país onde exercem suas atividades. Assim, temos os Sindicatos nos setores econômicos de transportes marítimos, terrestres e aéreos, nos setores da indústria, do comércio, das emprêsas radiotelegráficas etc.

Logo, diante disso, a pretensão de ser criado um Sindicato conforme o proselitismo daquele velho radiotelegrafista, objetivando a unidade nacional dêsse importante setor profissional, não era possível, e assim, a questão ficou posta diante de um dilema: mudar a sistemática sindical, fazendo o enquadramento por profissões – o que seria um absurdo inigualável no mundo inteiro – ou desistir do Sindicato Nacional dos Radiotelegrafistas (terra, mar e ar).

Pensamos que a solução objetiva seria a aceitação da segunda hipótese e procurar permanecer na sistemática sindical, dentro do setor econômico de transportes aéreos, e lutar juntos com as outras Categorias profissionais, dentro de um só Sindicato, pelas rei- vindicações gerais, e também as de caráter específico dos radiotelegrafistas.

Entretanto, o que aconteceu? Qual a posição que esse velho radiotelegrafista tomou, após tanto tempo de andanças pelo Ministério do Trabalho? Aqui Cabe ressaltar que os trabalhadores têm ferrenhos adversários que se opõem a sua unidade, mesmo situando o problema da unidade em face da atual sistemática do enquadradamento sindical. Esses inimigos da união da classe trabalhadora usam de todos os recursos possíveis, inclusive conscientes ou não, dentro do govêrno, do Ministério do Trabalho e no seio da própria classe, para criar condições de divisão e raramente o conseguem.

Senão, vejamos um fato concreto: Enquanto no setor de transportes aéreos os patrões estão num só Sindicato. que é o Sindicato Nacional das Emprêsas Aeroviárias, nós estamos divididos em três Sindicatos e, em 1955 estivemos com quatro Sindicatos e quase ficamos pulverizados em seis Sindicatos. Aquele foi o ano que mais lutamos pela unidade e contra os golpes desferidos pelos nossos adversários, tendo a manobrar as suas “marionetes”, os próprios Ministérios do Trabalho e da Aeronáutica daquela época.

Também, cumpre citar, a guiza de esclarecimentos, que não podemos desligar o problema da unidade dos trabalhadores da situação política dominante num país, num dado momento histórico. Isto é tão verdadeiro que, sempre que estas condições tendem para um regime anti-democrático de excessão, e de políticos ditadores carismáticos e esquisitos, que se dizem salvadores da pátria, mediante fórmulas mágicas de govêrno os Sindicatos são divididos em outros Sindicatos menores, os combativos e denodados dirigentes sindicais são presos por êste ou aquele pretexto. Os pêlegos assumem o comando e a intervenção dêsse govêrno, ronda os Sindicatos, impedindo que os trabalhadores lutem por reajustamentos de salários, contra a carestia e por melhores condições de vida. Esta é a razão porque os trabalhadores para benefício da unidade sindical devem lutar por um regime democrático, sem discriminação filosófica, religiosa, racial ou política, pelas liberdades sindicais e contra elementos divisionistas, dentro e fora da classe trabalhadora.

Voltamo-nos se caso da erlação do pretendido Sindicato Nacional dos Radiotelegrafistas (terra, mar e ar). Não sendo possível alcançar êsse objetivo, qual foi a posição do velho radiotelegrafista? Depois de ouvir os cantos de sereia, quando de suas andanças Pelo Ministério do Trabalho, enveredou pelo caminho da divisão dos trabalhadores em transportes aéreos, aceitando e defendendo desde 1955, a criação do Sindicato Nacional, já, agora, dos Radiotelegrafistas em Transportes Aéreos.

De fato, êste Sindicato estaria dentro da sistemática sindical, porque êle se enquadraria um setor econômico específico. Mas, seria divisionista porque se fosse levado à prática êsse critério de constituir Sindicatos por profissões dentro de um setor econômico, o que simplesmente foi feito em 1955, com os marítimos, nós teríamos, dentro em breve, os seguintes Sindicatos Nacionais em Transportes Aéreos: Pilotos, Mecânicos de Voo, Radiotelegrafistas de Vôo, Comissários. Navegadores, Despachantes, Mecânicos de Terra, Escriturários, Radiooperadores de Terra. Teletepistas. Contadores, Motoristas, Engenheiros etc., etc.

Ao nosso ver, quais seriam as consequências deste critério? Esses sindicatos teriam de 1.000 a 50 e até 5 associados. Do ponto de vista prático e financeiro seria uma calamidade, pois cada Sindicato te- ria que alugar uma sede, pagar no mínimo um advogado, 4secretárlo, “boy”, etc. Quanto ao valor das mensalidades, variariam de sindicato para Sindicato, aumentando na proporção em que fosse menor o número de associados. Para se dar uma ideia, somente, citamos o atual Sindicato dos Aeronautas que conta com dois mil associados e cuja mensalidade é de Cr$ 150,00, isto para poder funcionar como Sindicato, com relativa atividade. Quanto à parte política sindical seria uma negação, pois só a negação da unidade sindical poderia engendrar tamanho divisionismo.

Ora, companheiros, nós temos que fazer coisas novas, mas novas de verdade. A história do movimento sindical no mundo e no Brasil nos ensina que os nossos avós tentaram fazer multas coisas que deram certas e outras não. Por que vamos repetir experiências que não deram certo?

Dentro da nossa atual situação sindical, desde que haja vontade e condições de lutar dessa ou daquela categoria, dêsse ou daquele grupo de vôo, nada impede que as mesmas se unam sob a orientação das diretorias de um Sindicato comum, com a solidariedade e a ajuda fraternal das outras categorias irmãs, à base da unidade, obtém, assim, grandes vitorias. Para ilustrar essa assertiva, citamos os fatos e lembramos os movimentos bem sucedidos dos mecânicos de voo, da PANAIR, em 1954. dos radiotelegrafistas de terra e teletipista da PANAIR, em maio de 1959; do grupo de vôo do Concórcio, em agôsto de 1958; do grupo de vôo da VASP, em outubro de 1958; e outros tantos,

Ao nosso ver, êsses movimentos só devem ocorrer quando se tratar de assuntos específicos com vistas à unidade sindical, como por exemplo: a padronização dos salários; a regulamentação da profissão, etc. Qual a necessidade que impulsiona uma luta dessa natureza? Essa necessidade surge no momento em que uma determinada categoria profissional ou grupo de vôo toma consciência de que existem categorias similares ou grupo de voo com melhor paga pelo mesmo trabalho prestado; etc. Ai, então, temos a luta pela equiparação.

Dentro desse raciocínio chegará um momento em que as disparidades existentes ficarão reduzidas a tal ponto que será mais fácil uma luta geral pelas aspirações comuns a todas as categorias. Entretanto, isto não impede que no momento não se lute por uma reivindicação comum a todos, desde que a mesma seja fortemente sentida pela maioria e que todos estejam dispostos a consegui-la na base de uma ampla unidade, capaz de superar as divergências que porventura existirem dentro de um mesmo grupo, entre êste ou aquêle grupo, entre esta ou aquela categoria profissional.

Se dentro da nossa estrutura sindical de agora é possível que isto tudo tenha acontecido e possa acontecer com vistas ao futuro, a exequibilidade de termos um único Sindicato que seria o Sindicato Nacional dos Trabalhadores na Aviação Civil, assim como os patrões têm o dêles que é o todo-poderoso econômicamente falando – Sindicato Nacional das Emprêsas Aeroviárias – porque criar mais Sindicatos que nos possam dividir ainda mais?

O nosso velho radiotelegrafista a que nos referimos é o teimoso e está fazendo o jôgo do diabo. Por isto fica cada vez mais isolado pelos protestos dos companheiros que das mais diversas formas já se manifestaram contra a criação desse novo Sindicato que de novo só tem o nome e a legenda, porquanto êsses companheiros já estão filiados aos atuais Sindicatos e neles podem lutar desde que queiram frequentá-los, organizando-se para as lutas.

O nosso velho radiotelegrafista já foi convidado diversas vezes pela diretoria do Sindicato Nacional dos Aeroviários o qual êle deve pertencer, para, dentro dêle, se quizesse, organizar um departamento de radiotelegrafistas, procurando atender, inclusive, esses profissionais abandonados nas pequenas cidades dos diversos Estados. Entretanto, qual é a sua atitude diante de tão fraternal convite à unidade e ao trabalho sindical prático e profícuo?

A sua atitude é de recusa sistemática. Ademais, convém ressaltar a posição dêsse senhor na greve dos aeroviários em 1957. Deflagrado o movimento, o autor dêste artigo telefonou para PQJ, estação rádio da Cruzeiro e falou com o “velho”: “E’ uma hora de decisão, sou um aeronauta que na medida do possível ajudo os aeroviários para que seja rápida e possível a vitória. Você aeroviário, deve largar os fones e se juntar aos companheiros em luta. Esse seu gesto esclarecerá aqueles que duvidam de sua honestidade por suas ideias que discordamos com respeito a orientação sindical”,

O velho simplesmente respondeu-lhe:

– Eu tenho minhas idéias e discordo da greve”.

Isto é, Êle estava contra a vontade de 4 mil aeroviários que votaram por unanimidade, pela greve naquela célebre assembléia.

Ao velho nós aqui repetimos, a você ou a qualquer companheiro: as portas continuam abertas para trabalhar, mas trabalhar a favor e não contra os trabalhadores.

Nós sabemos que existem sérias contradições no nosso meio de trabalhadores transportes aéreos e são essas contradições que os nossos adversários mais exploram. Existem as contradições entre profissionais da mesma categoria, entre profissionais de categorias diferentes, entre as categorias de terra e de voo, de indivíduos para indivíduos e as vezes o próprio individuo é contraditório consigo mesmo.

Será que por causa disso vamos deixar que nos dividam embalados na “doce” cantilena da vaidade profissional que alimenta nossas maiores contradições? Pelo contrário, o que temos que fazer é conhecer o que realmente existe entre nós, procurar as suas causas e tudo fazer para superar as nossas divergências, vaidades e contradições, e, imbuídos do mais elevado humanismo e espírito fraternal, buscar unir cada vez mais todos os homens que trabalham na aviação comercial do Brasil e do mundo, pois, procurando bem, existe um forte elo que unirá a todos aquêles que trabalham. Agora, diante da insistência dos nossos adversários em querer nos dividir, ao finalizar, deixo aqui um apêlo a todos os aeronautas e aeroviários em geral, aos radiotelegrafistas em particular, para que, mais uma vez, enviem telegramas de protesto ao Ministro do Trabalho, Presidente e Vice Presidente da República, contra a criação de novos Sindicatos na aviação comercial.

Autoria: Waldir Grasso*

Data: agosto de 1959

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(*) Secretário do Sindicato Nacional dos Aeronautas