Ano: 1822

Independência do Brasil

A Independência do Brasil não foi um fato histórico decorrente de um corte revolucionário e abrupto com o sistema colonial, com a metrópole portuguesa e nem com a monarquia. Foi um processo que resultou em algumas mudanças estruturais importantes, mas também manteve muitas características do período anterior. Independentemente da forma como se deu este processo, a questão que se impõe, primeiramente, é porque se tornou impossível manter o sistema de relações entre metrópole e colônia. Que circunstâncias teriam levado à crise do sistema colonial tradicional? (COSTA, 2010: 21)

Segundo Emília Viotti da Costa, os fundamentos do sistema colonial tradicional estavam, entre o final do século XVIII e início do século XIX, abalados por diversos tipos de pressões internas e externas.

No âmbito internacional, podemos dizer que a crise do sistema colonial coincidiu com a crise das formas absolutistas de governo. Com o advento do Iluminismo na Europa, o novo instrumental crítico e intelectual que culminou na Revolução Francesa, forneceria aos colonos da América Portuguesa, os argumentos teóricos que precisavam para justificar sua rebeldia.

Além disso, o sistema colonial tradicional entrou em crise quando a expansão dos mercados, fomentada pelo desenvolvimento crescente do capital industrial, e a crise do Estado absolutista tornaram inoperantes os mecanismos restritivos de comércio e de produção.

Emilia Viotti destaca que “os monopólios e privilégios que haviam caracterizado o sistema colonial tradicional apareceriam então como obstáculos aos grupos interessados na produção em grande escala e na generalização e intensificação das relações comerciais. O extraordinário aumento da produção proporcionado pela mecanização era pouco compatível com a persistência de mercados fechados e de áreas enclausuradas pelos monopólios e privilégios. O sistema colonial tradicional passou a ser criticado. A teoria econômica foi reformulada e os postulados mercantilistas substituídos pelas teses de livre-cambismo, mais adequadas ao novo estágio de desenvolvimento econômico e aos interesses dos novos grupos associados ao processo de industrialização”. (COSTA, 2010, p.22).

Internamente, tornavam-se cada vez mais abusivas as restrições comerciais impostas pela metrópole, especialmente após a descoberta do ouro na região das Minas Gerais que estimulou, no século XVIII, o desenvolvimento do mercado interno. Os colonos que se consideravam em princípio, portugueses no Brasil, logo perceberam a incompatibilidade entre seus interesses e os interesses metropolitanos.

Foi por essa razão que as populações coloniais se mostraram receptivas às ideologias revolucionárias que se difundiam na Europa naquele século. Os exemplos da Revolução Americana e da Revolução Francesa, mais que os livros, tiveram um efeito contagiante na América.

Segundo Costa, a grande maioria da população permaneceria, no entanto, alheia a estas especulações teóricas, sendo a elite educada nos princípios da Ilustração, a principal responsável por mobilizar a questão da Independência. De acordo com Boris Fausto (2018), a história desse processo passa fundamentalmente pela transferência da família real portuguesa ao Brasil e pela abertura dos portos brasileiros ao comércio exterior. Este fato facilitou a entrada de estrangeiros em número crescente na colônia, intensificando os contatos entre Brasil e Europa, e facilitando ainda mais a divulgação das ideias revolucionárias.

Já no século XVIII começam a se multiplicar por aqui as sociedades secretas do tipo Maçonaria. De sociedades como essas saíram os quadros que formariam movimentos como a Conjuração Baiana e a Revolução Pernambucana de 1817. Os mais representativos elementos da sociedade faziam parte dos quadros maçônicos: professores, funcionários, comerciantes, fazendeiros e muitos padres. Assim, a Maçonaria imprimiria as diretrizes do movimento pela Independência. (COSTA, 2010: 31)


José Peregrino recusando a seu pai abandonar a causa republicana [Iconográfico]:
Revolução de Pernambuco 1817.
Paris [França]: [s.n.], 1918.
Biblioteca Nacional Acervo Digital.

 


Bandeira Republicana de 1817 autoria do pintor Antônio Alves por ocasião da Revolução Pernambucana.
As três estrelas representam Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte.
Biblioteca Nacional Acervo Digital.

Apesar do sucesso das ideias ilustradas entre as elites da colônia, muitas foram as barreiras de ordem material para a sua difusão. Analfabetismo, marginalização da população da vida política, meios de comunicação ainda não desenvolvidos, transportes deficientes etc. O maior entrave, porém, vinha da incompatibilidade das ideias liberais com a realidade brasileira.

Aqui, as ideias liberais teriam um significado muito mais restrito do que na Europa, posto que não se apoiavam nas mesmas bases sociais. Se na Europa o liberalismo consistia numa ideologia burguesa que se voltava contra o Antigo Regime, no Brasil não existia nem mesmo uma burguesia dinâmica e ativa.

Os adeptos às ideias liberais eram muitas vezes ruralistas, membros das camadas senhoriais que não estavam dispostas a renunciar ao latifúndio e menos ainda da propriedade escrava. O comportamento dos revolucionários era frequentemente elitista, racista e escravocrata. Havia, inclusive, uma verdadeira aversão às massas e um medo constante de um levante de negros, o que acarretaria no rechaço às formas mais democráticas de governo e na adesão pela conquista da independência com a ajuda da própria monarquia portuguesa.

Outro fator peculiar do liberalismo brasileiro é a conciliação com a Igreja Católica. Por conta do Direito de Padroado, os padres ficavam submetidos diretamente ao poder real, o que explica a hostilidade dos religiosos com a Monarquia e sua adesão à Maçonaria e aos movimentos revolucionários. Também o nacionalismo na colônia portuguesa na América teve uma natureza muito limitada. No Brasil faltavam as condições que na Europa levavam a uma maior integração nacional. A economia baseava-se essencialmente na exportação, o mercado interno era restrito e as vias de comunicação e transporte eram muito precárias, dificultando os contatos entre as várias regiões do país.  Não por acaso todos os movimentos revolucionários anteriores à Independência tiveram um caráter local: Conjuração Baiana, Inconfidência Mineira e Conjuração do Rio de Janeiro. Somente a Revolução Pernambucana de 1817 conseguiu aglutinar um número maior de províncias, mas ainda assim restringiu-se à atual região nordeste.

O nacionalismo brasileiro manifestava-se principalmente sob a forma de anti-lusitanismo. A maioria dos que aderiram aos movimentos revolucionários eram de origem brasileira e nutriam grande aversão aos “branquinhos do reino”. Nesse sentido, segundo Costa, não raro as hostilidades contra Portugal tomaram o aspecto de uma luta racial entre os “mestiços” e os “branquinhos”. (COSTA, 2010: 35).

“Para o povo composto de negros e mestiços a revolução da Independência configurava-se como uma luta contra os brancos e seus privilégios. Para os despossuídos, a revolução implicava a eliminação das barreiras de cor, na realização da igualdade econômica e social, na subversão da ordem. Para os representantes das categorias superiores da sociedade, fazendeiros ou comerciantes, a condição necessária da revolução, no entanto, era a manutenção da ordem e a garantia de seus privilégios. Dessa forma, o movimento que aglutinava elementos pertencentes a diferentes estratos da sociedade representava aspirações até mesmo contraditórias. As fórmulas abstratas constantes dos programas dos revolucionários ocultavam os diferentes sentidos que cada grupo lhes atribuía. (Idem, p.39)

Ao final do século XVIII, os movimentos revolucionários de Minas Gerais (1789), Rio de Janeiro (1792) e Bahia (1798) tinham sido rapidamente sufocados. E, mesmo que o descontentamento de certos grupos diante do domínio português na colônia fosse crescente, era pouco provável que fosse possível declarar o país independente em menos de uma geração. Um fato viria precipitar os acontecimentos: a transferência de D. João VI e da família real portuguesa para o Brasil em 1808, decorrente da invasão francesa na Península Ibérica.

 A Corte portuguesa no Brasil

A abertura dos portos a todas as nações amigas, a transferência da sede do governo para o Rio de Janeiro e a elevação, em 1815, do Brasil à categoria de Reino Unido, foram fatores que prejudicaram profundamente os interesses metropolitanos. A Inglaterra foi a principal beneficiária dessas medidas, tendo agora o porto do Rio de Janeiro como porta de entrada para seus produtos manufaturados. Também os proprietários rurais produtores de bens destinados à exportação se beneficiaram com o fim do monopólio comercial com a metrópole. “Daí pra frente seria possível vender a quem quer que fosse sem as restrições impostas pelo sistema colonial.” (FAUSTO, 2018: 67)

Em 1810, teria culminância a escalada inglesa pelo controle do mercado colonial brasileiro com o Tratado de Navegação e Comércio. Com ele, os produtos ingleses ficaram em vantagem até em relação aos portugueses. Sem proteção tarifária os produtos de Portugal ficavam em desvantagem em preço e variedade com aqueles produzidos na Inglaterra. Outra preocupação que a política britânica causava nos setores dominantes da sociedade colonial era o combate ao comércio de escravos. De acordo com o Tratado de Aliança e Amizade de 1810, a Coroa portuguesa se obrigava a limitar o tráfico de escravos aos territórios sob o seu domínio e prometia tomar medidas para restringi-lo. No Congresso de Viena em 1815, os portugueses assinaram um novo tratado concordando com o fim do tráfico ao norte do equador, a fim de que o comércio de escravos da Costa da Mina para o Brasil terminasse. À Inglaterra, concedia-se o direito de fiscalizar e até mesmo apreender os navios suspeitos de transportar cativos.

A transferência da família real para o Brasil mudou também o quadro das relações exteriores da monarquia no contexto da América do Sul. Agora era no Rio de Janeiro que a política externa era decidida, instalando-se na cidade o Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. A vinda da família real, portanto, deslocou definitivamente a vida administrativa da colônia e transformou profundamente a fisionomia da cidade, nova capital da Corte. Abriram-se teatros, bibliotecas, academias literárias, e o primeiro jornal editado na colônia foi lançado. O número de habitantes passou de 50 mil para 100 mil pessoas. Imigrantes de origem portuguesa, inglesa, francesa e espanhola vinham formar na cidade uma classe média de profissionais qualificados nas mais diferentes atividades. Além deles, cientistas, e artistas de renome como Carl Von Martius, Auguste Saint Hilaire, Grandjean de Montigny, Nicolas-Antoine Taunay e Jean-Baptiste Debret.

A Revolução do Porto

A partir da abertura dos portos, o impulso dado à economia tornava cada vez mais obsoleto o caráter das instituições coloniais e o monopólio dos cargos administrativos pelos portugueses parecia cada vez mais inaceitável ao olhar da população brasileira. Já em Portugal acumulavam-se os descontentamentos com o fim do pacto colonial. Assim, em 1820 irrompeu na cidade do Porto uma revolução liberal inspirada nas ideias ilustradas. Os revolucionários procuravam saídas para a crise política, econômica e militar em que o país se encontrava. No fim daquele mesmo ano, os revolucionários estabeleceram em Portugal uma Junta Provisória para governar em nome do Rei D. João e exigiram seu retorno à metrópole, a fim de que redigisse e aprovasse a constituição. Os acontecimentos repercutiram no Brasil, onde as adesões à revolução constitucionalista do Porto se multiplicaram.

Thierry Frères. Départ de la Reine: pour se rendre à bord du vaisseau Royal destiné à conduire sa Cour à Lisbonne [Iconográfico].
Paris [França]: Firmin Didot Frères, 1839.
Biblioteca Nacional Acervo Digital.

“Fazendeiros, comerciantes nacionais ou estrangeiros, funcionários da Coroa radicados no Brasil, cujos interesses os levavam a se identificar com a causa do Brasil, viam na revolução uma conquista liberal que poria por terra o absolutismo, os monopólios e os privilégios que ainda sobreviviam. Acreditavam que a instituição de um governo constitucional lhes daria a oportunidade de representar nas Cortes os interesses da Colônia, consolidando as regalias conquistadas em 1808 e ampliadas em 1815, com a elevação do Brasil à categoria de Reino”. (COSTA, 2010, p. 44)

A contradição entre os interesses dos grupos metropolitanos e coloniais permanecia subjacente, mas não tardaria muito a se manifestar. A revolução logo assumiria um caráter antiliberal, na medida em que um de seus principais objetivos era destruir as concessões liberais feitas por D. João VI ao Brasil. Assim, o conflito entre liberais brasileiros e portugueses não tardou a emergir.

As medidas tomadas pelas Cortes revelaram as intenções de restringir a autonomia administrativa da colônia, limitar a liberdade de comércio, restabelecer os monopólios e privilégios anteriores à transferência da Corte para o Rio de Janeiro. Essas decisões soaram como uma declaração de guerra ao Brasil, provocando tumultos e manifestações de desagrado. Ficava cada vez mais claro que a minoria de deputados brasileiros em Lisboa nada poderia fazer pela causa brasileira. Ia crescendo assim, o número de adeptos pela Independência.


Fontes, Constantino de. Desembarque d’El Rei Dom João.
Acompanhado por uma Deputação das Cortes.
Na Magnífica Praça do Terreiro do Paço em 4 de Julho d’1821, regressando do Brazil [Iconográfico].
Biblioteca Nacional Acervo Digital.

O rei, por sua vez, procurava uma solução que conciliasse os diversos interesses em disputa, mas as pressões aumentavam a cada dia. As tropas portuguesas nas províncias do Grão-Pará e da Bahia revoltaram-se formando juntas governativas que prometeram só obedecer às Cortes de Lisboa. Também houve pressão das tropas sediadas no Rio de Janeiro, essas sim, foram decisivas para que em fevereiro de 1821 D. João VI aceitasse a Constituição a ser escrita e anunciasse seu retorno para Portugal. Em 26 de abril daquele mesmo ano, o rei regressa, mas deixa como príncipe regente do Brasil, seu filho Pedro. Assim, atendia às exigências das Cortes, mas não descontentava aos que defendiam a permanência da família real no Brasil.

Com a partida do rei e a permanência do príncipe, durante algum tempo ainda se alimentou a esperança de manter unidas as duas Coroas. A classe dominante brasileira encarava com simpatia a instituição de uma monarquia dual, desde que fosse resguardada a autonomia do Brasil. Essa era a opinião do influente ministro, José Bonifácio de Andrada e Silva, um dos principais artífices da Independência, avesso a mobilização das massas. O príncipe regente lhe pareceu o instrumento ideal para a conquista e consolidação da autonomia desejada, sem que para isso fosse necessária a mobilização popular.

O “Fico” e a Proclamação da Independência

As Cortes começaram a se reunir em janeiro de 1821, tomando uma série de medidas que produziram profundo descontentamento na colônia. Os governos provinciais passariam a ser independentes do Rio de Janeiro, subordinando-se diretamente a Lisboa. Houve ainda uma tentativa de revogar os acordos comerciais com a Inglaterra. Entre setembro e outubro de 1821, novas medidas tomadas pelas Cortes fortaleceram no Brasil a opção pela independência: decidiu-se transferir para Lisboa as principais repartições instaladas do Brasil por D. João VI; destacaram-se novos contingentes de tropas para o Rio de Janeiro e Pernambuco; exigiu-se a volta do príncipe regente para Portugal.

Pedro Américo.
Independência ou Morte, 1888.
Exposta no Museu Paulista.
Domínio Público.

Em 9 de janeiro de 1822, o príncipe aceitou a solicitação do Senado da Câmara do Rio de Janeiro e optou por permanecer no Brasil. Para Costa, não se tratava ainda de uma ruptura, pois o gesto foi saudado com gritos de “Viva as Cortes” e “Viva a União de Portugal com o Brasil”. “Tentava-se ainda manter aberta a possibilidade de se constituir uma monarquia dual com sede simultânea em Portugal e no Brasil, visando manter o Brasil como Reino Unido a Portugal. Ao mesmo tempo, procurava-se preservar a autonomia administrativa e comercial alcançada.” (COSTA, 2010, p. 49)

Por outro lado, Fausto defende que a decisão do príncipe regente de ficar no país representou a escolha de um caminho sem retorno. “Os atos do príncipe regente posteriores ao Dia do Fico foram atos de ruptura.” (FAUSTO, 2018, p. 73) As tropas portuguesas que se recusaram a jurar fidelidade a d. Pedro foram expulsas do Rio de Janeiro, esboçando-se, a partir daí, a criação de um exército brasileiro. Seguiu-se, na semana imediata à resposta afirmativa do príncipe a formação de um novo ministério, chefiado por José Bonifácio.

Após o Dia do Fico as forças políticas que defendiam a permanência do príncipe no Brasil se apresentavam da seguinte forma:

“De um lado estavam os absolutistas, contrários às cortes de Lisboa porque elas pretendiam fazer de Portugal uma monarquia constitucional. De outro, aqueles que formavam o Partido Brasileiro. Estes estavam divididos em dois grupos: os democratas, que tinham em Joaquim Gonçalves Ledo seu elemento mais representativo, e os aristocratas, liderados por José Bonifácio”. (MATTOS & ALBUQUERQUE, 2003, p.61)

François-René Moreaux.
Príncipe Pedro rodeado por uma multidão em São Paulo depois de dar a notícia da independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822.
Revista de História da Biblioteca Nacional nº 24 / nº 48.
Domínio Público.

A liderança do príncipe permitiu, no entanto, a aglutinação dos grupos os mais diversos. As divergências entre os democratas e os aristocratas não eram suficientemente fortes a ponto de impedir a união em torno de d. Pedro. Tornando-se cada vez mais improvável a concretização da união dos reinos de Brasil e Portugal, o príncipe regente decretou em junho de 1822, a convocação de uma Assembleia Constituinte, o que já era praticamente uma declaração de Independência. Em 5 de agosto, recomendou-se aos governos provinciais não dar posse a empregados despachados de Portugal. O príncipe determinou que as tropas portuguesas que desembarcassem no país deveriam ser consideradas inimigas. Por fim, Ledo e Bonifácio começam a dirigir manifestos às nações amigas.

“A chegada de despachos de Lisboa que revogavam os decretos do príncipe regente, determinavam mais uma vez seu regresso a Lisboa e acusavam os ministros de traição deu alento à ideia de rompimento definitivo. A princesa dona Leopoldina e José Bonifácio enviaram às pressas as notícias ao príncipe, em viagem a caminho de São Paulo. Alcançado a 7 de setembro de 1822, às margens do riacho Ipiranga, dom Pedro proferiu o chamado grito do Ipiranga, formalizando a independência do Brasil. A 1º de dezembro, com apenas 24 anos, o príncipe regente era coroado imperador, recebendo o título de dom Pedro I. O Brasil se tornava independente, com manutenção da forma monárquica de governo. Mais do que isso, o novo país teria no trono um rei português. (FAUSTO, 2018, p.74)

Uma vez proclamada a Independência, o governo português não tardaria em retomar as negociações a fim de restabelecer a situação anterior. Em vão! De pouco valeram as consultas em várias Cortes europeias a fim de angariar apoio e simpatia para a causa portuguesa. A posição do governo inglês foi decisiva, forçando o país a aceitar o fato como consumado.

Realizada a Independência, a diferença entre grupos radicais e conservadores tornou-se mais evidente. Mas em comum, estes grupos possuíam o perfil de seus membros, geralmente homens de origem econômica privilegiada de mais de cinquenta anos. Poucos eram portugueses de origem e a maioria realizara seus estudos na metrópole. Ligavam-se frequentemente por laços de família e já haviam ocupado posições na qualidade de funcionários da Coroa, e depois da Independência permaneceram ocupando postos administrativos de relevância. (COSTA, 2010: 59) Assim, a concentração do poder nas mãos dessa minoria privilegiada, explica a sobrevivência das estruturas tradicionais de produção e das formas de controle político típicas dos grandes proprietários que se empenhavam pela manutenção da marginalização das massas de todo e qualquer processo político.

Jean-Baptiste Debret.
Coroação do imperador Pedro I em 1º de dezembro de 1822.
Domínio Público.

Embora com a proclamação da Independência o Brasil tivesse passado da condição de Reino Unido a Império, e os negociantes de escravos estivessem em condição cada vez mais difícil com a perseguição dos navios ingleses, a vida dos escravos permaneceria igual por ainda bastante tempo. Eles continuavam sujeitos ao trabalho forçado na lavoura, nas minas, nos serviços domésticos ou urbanos. “Seu trabalho permanecia enriquecendo, acumulando poder e dando prestígio a seus senhores.” (MATTOS & ALBUQUERQUE, 2003, p. 86) Também a vida da população livre e pobre permanecia sem “modo certo”, como a dos escravos, sua vida havia mudado bem pouco.

O mesmo não se pode dizer dos antigos colonizadores e colonos. Em todo o Império, tornaram-se cidadãos ativos pela Constituição de 1824, ou seja, cidadãos capazes de eleger seus representantes para os cargos do Legislativo e foram os grandes responsáveis por transformar a Colônia em Império do Brasil.

“De modo original, as trajetórias de suas vidas mostravam como muitas vezes torna-se necessário mudar para que algumas coisas permaneçam. Foi fazendo do Brasil um Império que eles puderam conservar os escravos e as terras que possuíam, manter os cargos administrativos que ocupavam, tornar a religião Católica, Apostólica Romana a religião do Império e prosseguir prosperando com seus negócios à sombra do Estado. (Ibidem, ibidem)

Referências Bibliográficas

COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: Momentos decisivos. São Paulo: Editora UNESP, 2010.

FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2018.

MATTOS, Ilmar Rohloff de & ALBUQUERQUE, Luis Affonso Seigneur. Independência ou morte: A emancipação política do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2003.

NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial (1777-1808). São Paulo: Hucitec, 1986.