Onde está a história de São Paulo
Onde está a história de São Paulo?
Em meio aos milhares de edifícios e ruídos, seu passado, frequentemente, passa despercebido. Na verdade, durante o ano todo, a história da cidade é lembrada uma única vez, no dia do seu aniversário; assim retornamos, ligeiramente, ao século XVI e ao Pátio do Colégio. Aparentemente, portanto, o único momento histórico vivido pela capital paulista se refere à sua fundação.
Evidentemente a história do berço dos paulistanos é muita mais rica e não pode se resumir a um fato. Talvez uma das marcas mais fascinantes de São Paulo seja sua súbita transformação. Em meados do século XIX era uma vila, no século XX uma das maiores metrópoles do mundo. Nesse processo insólito alguns personagens se destacaram.
Para encontrar a história da capital paulista é necessário percorrê-la, sair do trajeto usual, espiar pelos buracos das fechaduras, se interessar pelos detalhes. O historiador Nicolau Sevcenko elegeu, por exemplo, a desconhecida Rua São Paulo como a mais representativa da cidade. Nesse sentido, ele tentou compreender a metrópole “por aquilo que ela oculta, pelo que relega, pelo que escamoteia”.
Um exercício semelhante pode ser feito na Rua Visconde de Parnaíba. Seus quase dois mil metros de extensão ligam, na teoria, a Rua do Hipódromo à Rua da Figueira (próxima das margens do Tamanduateí).
Na prática é impossível andar, em linha reta, de uma ponta a outra da via. No meio do caminho, inevitavelmente, haverá um encontro com a história.
A Visconde de Parnaíba é dividida pelo ir e vir dos trens que desfilam na antiga São Paulo Railway. Um observador mais atento, encostado em um dos lados da ferrovia, reparará que há uma estação sem nome, aparentemente abandonada, ausente do atual mapa do transporte metropolitano.
Já do lado oposto da linha férrea o caminhante estará defronte a um edifício amplo, de estilo eclético e protegido por um belo jardim. Se trata da antiga Hospedaria de Imigrantes do Brás (Museu da Imigração) e sua respectiva estação ferroviária.
O local da construção da hospedaria foi estratégico, justamente na confluência das duas principais ferrovias do estado – a São Paulo Railway conectava Santos a Jundiaí e a Central do Brasil que ligava a capital paulista com o Rio de Janeiro. De 1887 até 1978 a Hospedaria do Brás acolheu mais de 2,5 milhões de pessoas. A princípio seus hóspedes eram, majoritariamente, migrantes estrangeiros que chegavam pelo porto de Santos. Após 1930 se aglomeravam na antiga estação do Norte os migrantes nacionais, especialmente nordestinos, que em cinco minutos de caminhada chegavam à hospedaria.
São Paulo se transforma com a imigração. Sem os trens tais fluxos não poderiam ter ocorrido. E, portanto, no meio de uma rua e no meio do trajeto de diversas pessoas – que utilizam os trilhos da CPTM para seus afazeres cotidianos – que a metrópole paulista nasce. A São Paulo gigante, cosmopolita, de tantos rostos e culturas trazidos pelas ferrovias é também uma cidade dos paradoxos. Por aqui no meio encontramos o começo.
Autoria: Henrique Trindade Abreu *
Data: 01 de janeiro de 2020
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(*) Historiador