Transporte Marítimo de Cabotagem

Muito se tem falado e escrito nos últimos anos sôbre a diminuição do transporte de cabotagem no Brasil.

Pelo fato da grande extensão da nossa costa marítima, dos inúmeros portos naturais e da concentração da população ao longo dessa costa, julga-se que o transporte de cabotagem deva desempenhar uma função primordial no transporte do país.

Assim sendo, aquêles que abordam o assunto julgam um absurdo a queda no transporte de cabotagem ocorrida nos últimos dez anos e atribuem o fato à má administração das emprêsas de navegação e à política trabalhista demagógica de certos governantes do país.

Realmente, a velocidade de operação dos navios é reduzida, a capacidade de utilização é baixa, o pessoal de bordo é excessivo, a mão de obra nos portos (estiva e capatazia) é elevada e de baixa produtividade.

Concordamos com as deficiências do nosso transporte de cabotagem. Todavia, atribuir a queda dêsse transporte unicamente a essas deficiências é um êrro grave.

Pelos dados estatísticos constantes do quadro ao lado, verifica-se que a diminuição ocorreu após o ano de 1956 com o transporte de carga geral.

Êsse declínio verificou-se exatamente após a implantação da indústria automobilística no Brasil e quando se deu início aos grandes planos rodoviários.

Não foi essa uma mera coincidência, mas sim uma consequência direta, isto é, começou a existir o transporte rodoviário interligando as diversas regiões do Brasil, o que antes só era possível através da via marítima.

Veja-se agora, no quadro ao lado, a situação do transporte de cabotagem nos Estados Unidos: Do total de 280 bilhões de t/milhas do transporte de cabotagem, 87% correspondente à carga líquida (petróleo e derivados) e apenas 13% à carga sêca.

Por outro lado, a maior parte do transporte de carga sêca consiste de carvão, do que resulta ser o transporte de carga geral por cabotagem insignificante.

Analisando-se, ainda no quadro ao lado, os transportes de carga sêca nos Estados Unidos, bem como as principais mercadorias transportadas, as respectivas direções do trans- porte e a evolução dêsses transportes nos últimos anos, verifica-se que, num período de 5 anos, entre 1957 e 1962, houve uma redução de 35% no transporte de carga sêca por cabotagem nos Estados Unidos.

O custo do transporte de carga geral em navios de linha regular, de 10.000t de capacidade de carga é, nos Estados Unidos, de 2 mills a tonelada milha, considerando-se um aproveitamento de carga de 70% (o mil é a milésima parte do dólar).

Êsse custo é evidentemente baixo quando comparado com os demais sistemas de transporte. Nesse valor não está, todavia, incluido o custo do navio quando parado para carga e descarga, considerando-se que são necessários vários dias para êsse serviço em cada pôrto. Há ainda os custos de estiva e capatazia e as demais taxas portuárias. Devem ainda ser adicionados os custos do transporte do armazém do remetente até o pôrto de embarque e posteriormente do pôrto de descarga até o armazém do destinatário.

Por outro lado, êsse tipo de transporte é demorado, não apenas pela menor velocidade dos navios (10 nós ou 18 km/h) como pelo tempo de carga e descarga (média de 100 toneladas por hora) e pelo tempo de espera devido aos intervalos existentes entre cada viagem.

Deve-se considerar ainda os riscos de extravio e danos a carga.

Assim, quando se leva em conta todos os fatores acima, êsse tipo de transporte torna-se econômicamente pouco atrativo quando comparado com os outros meios.

Êsse fato não é, portanto, exclusivo do Brasil. Como vimos acima, pelos dados estatísticos dos Estados Unidos, o transporte de carga em navios convencionais não mais compete com a ferrovia ou a rodovia.

Evidentemente, as condições do Brasil são outras que as dos Estados Unidos, servindo, todavia os dados como ilustração.

Muito se enganam aquêles que pensam que o transporte de cabotagem no Brasil irá recuperar a carga perdida nos últimos anos.

Faz-se necessário reconhecer que o frete é apenas um dos elementos do custo do transporte e que para a maioria das cargas, inclusive as de baixo valor, o fator tempo, isto é, entrega imediata, é fator primordial nos últimos dias de hoje.

O transporte de cabotagem no Brasil tem, portanto, que se restringir às cargas a granel, ou seja, petróleo e derivados, carvão, sal etc.

Todavia, nenhum outro país no mundo apresenta as mesmas caracteristicas de costa que o Brasil, razão pela qual deve o nosso país interessar-se pelo desenvolvimento de nova tecnologia para o transporte marítimo de cabotagem. Nos últimos anos tem-se feito estudos de novos tipos de navio para êsse transporte, tais como navio para transportar carretas como navio para transportar carretas, navio para transportar chatas, navio para transportar mercadorias em estradas (pallets), etc.

Acreditamos que no futuro, através de uma tecnologia adequada, venha o transporte de cabotagem de carga geral a ter um razoável desenvolvimento. No momento, todavia, deve-se aceitar, sem lamúrias, a realidade dos fatos, reconhecendo que se a carga passou a ir por caminhão a culpa não foi do Loide e nem do Gôverno.

 

Autoria: Gilberto Arantes Lanhoso *

Data: 01 de janeiro de 1968

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(*) Engenheiro