Dimensionamento de tancagem num terminal de granéis via simulação: um exemplo prático
1ª parte
Introdução
A despeito do grande aumento da movimentação de cargas em contêineres nos últimos anos, as cargas a granel ainda possuem grande importância no cenário portuário mundial. Os investimentos nesse tipo de terminal são altos, pois normalmente utilizam uma estrutura de dutos, de modo a permitir a transferência de produtos do navio para o tanque e vice-versa.
A simulação é uma metodologia que vem sendo cada vez mais explorada para lidar com questões de planejamento logístico. Isso ocorre devido à crescente complexidade dos problemas enfrentados pelos gestores. Por se tratar de um sistema altamente complexo, a operação de um terminal portuário é um caso no qual a simulação é amplamente utilizada. Segundo Wadhwa (1990), a ferramenta de simulação possui grande potencial para medir os efeitos das mudanças de variáveis operacionais, tecnológicas e de investimentos, auxiliando a tomada de decisão por parte dos gerentes.
Neste trabalho, focaremos em como diferentes padrões de chegadas de navios e prioridades de fila impactam no comportamento dos tanques, permitindo um melhor dimensionamento e menor investimento em capacidade de armazenamento. Para a realização dessa pesquisa, foi desenvolvido um modelo de simulação no software Arena, representando as operações características envolvidas nesse tipo de terminal.
Revisão de literatura
Nesta seção serão apresentados alguns trabalhos de outros autores no âmbito do estudo por nós realizado. Alderton (2008) apresentou a estrutura de um terminal de granel líquido com armazenagem em tanques. Em linhas gerais, um terminal de granel utiliza dutos que ligam o navio até o tanque, permitindo a transferência de carga. Essa estrutura é reconhecidamente frágil e o custo de construção é alto, na casa de milhões de dólares, o que justifica uma análise pormenorizada do trade-off entre os custos de investimento e os custos associados à fila de navios no terminal, conforme apresentado no gráfico 1.
Neste artigo, iremos utilizar um modelo de simulação no software Arena para descobrir os efeitos que as prioridades de fila e padrões de chegada têm sobre os tanques de um terminal de granel. Com relação aos diferentes padrões de chegada de navios e seus efeitos nas filas e tanques de um terminal de granel, Asperen et al. (2003a) realizaram um estudo via simulação. Nesse artigo, chegou-se à conclusão de que as chegadas descontroladas (distribuição exponencial) são as que apresentam os piores resultados, ou seja, maiores filas e maiores necessidades de tancagem. Em continuação ao seu estudo, Asperen et al. (2003b) destacaram a importância da adoção de prioridades para navios.
Foi utilizado um modelo de prioridade alta para navios grandes e baixa para os pequenos. Os autores concluíram que as embarcações com prioridade alta têm seu tempo médio de espera em fila reduzido em até três vezes, comparativamente às de baixa prioridade.

Em seu artigo, Dragovic et al. (2005) apontam os benefícios do uso do método da simulação para examinar os impactos da introdução de prioridades para diferentes tipos de navios. Nesse estudo, foram elaboradas diferentes estratégias de operação, baseadas em diferentes tipos de prioridade, determinando-se qual seria a melhor configuração de operação para esse terminal. Foi mostrado que, para um dos casos, atribuir prioridade para navios pequenos levaria a uma melhora da operação, com menor tamanho e tempo médio de fila.
A técnica de simulação no software Arena também foi utilizada por Wanke (2009), que desenvolveu um modelo a fim de realizar um estudo sobre como as diferentes normas de alocação de ancoradouro e prioridades de fila impactam no tempo de espera dos navios. Foi identificado que o elo navio-ancoradouro é afetado pelo conjunto de características dos navios no terminal, como os seus diferentes tamanhos, diferentes tempos entre chegadas e os diferentes tempos de processamento no ancoradouro. Outra constatação foi a de que a atribuição de prioridade de fila a navios com menor tempo de processamento melhora o desempenho geral do terminal.
O modelo
O passo inicial para a construção do modelo a ser estudado é o conhecimento de todos os processos envolvidos em tal situação, bem como o estabelecimento de premissas que permitam a elaboração do mesmo. O caso descrito a seguir foi baseado na situação apresentada por Asperen et al. (2003).
No caso estudado, temos um terminal onde ocorrem carregamento e descarregamento de cargas a granel. Essas cargas estão divididas entre matérias-primas e produtos acabados, sendo que ainda existe uma subdivisão dentro de cada um desses grupos.
As matérias-primas são subdivididas entre A e B e os produtos acabados, em C e D. O modelo compreende um terminal com quatro berços, quatro tanques de estocagem e uma fábrica.
Nos tanques são armazenadas as cargas listadas acima, e para cada tipo existe um tanque. A fábrica é responsável por transformar as matérias-primas A e B nos produtos C e D. Para a elaboração do modelo, adotamos como premissa que o funcionamento dela ocorre da seguinte forma: a cada hora, são consumidas pela fábrica 122,15 toneladas de A e 55,7 toneladas de B, que são transformadas em 49,3 toneladas de C e 125,7 toneladas de D, e enviadas para os seus respectivos tanques (ver Tabela 1). As ligações entre os navios e tanques e entre os tanques e a fábrica são feitas for dutos.
Os berços se diferenciam em aspectos como tamanho de navios que comportam e tipo de produtos que podem ser carregados ou descarregados. Os berços 1 e 2 são adequados para navios grandes, enquanto os 3 e 4 comportam apenas navios pequenos. Como já mencionado no parágrafo anterior, a transferência dos navios para os tanques é feita por dutos, um tipo de transporte que facilita muito essa operação.
No entanto, por terem um custo de construção muito alto, os berços têm restrições quanto ao tipo de produto que pode ser movimentado. No berço 1 são descarregados os materiais A e B e carregado o produto C. Já no berço 2 ocorre somente o processo de carregamento dos produtos C e D. No berço 3, os produtos movimentados são: A, B e C. Por fim, no berço 4, são realizadas as operações que envolvem os produtos A, B e D (ver Tabela 2).


Os navios que atracam nesse terminal também possuem algumas especificações, como tamanho (grande ou pequeno), toneladas transportadas, produto transportado e tempo de (des) carregamento. Tais especificações podem ser encontradas na Tabela 3, onde também são apresentados os dados referentes à quantidade de cada tipo de navio que transita por esse terminal – de 14 diferentes tipos.
Vale ressaltar que essas quantidades foram determinadas de modo que o total de toneladas transportado seja compatível com a capacidade da fábrica.
Para uma compreensão completa do que consiste o modelo, ainda devemos detalhar as prioridades envolvidas.
Como mencionado anteriormente, passam por esse terminal navios grandes e pequenos. Os grandes só podem ser atracados nos berços 1 e 2, enquanto os pequenos podem atracar em qualquer berço. Foram considerados três tipos de prioridades: para os navios grandes, para os pequenos e a clássica política PEPS, ou seja, o primeiro que entra é o primeiro que sai.
Na prioridade para navios grandes, ao navio pequeno deve ser dada preferência para os berços 3 e 4. Quando estes estiverem ocupados, ele atraca nos berços 1 ou 2, se não houver nenhum navio grande na fila. Caso contrário, o pequeno deve esperar na fila de um dos outros berços. Posteriormente, foi testada a prioridade para navios pequenos, na qual estes tinham preferência para atracar em qualquer berço, ou seja, se algum navio grande estiver na fila e um pequeno chegar, este último tem prioridade. Por fim, foi simulado o modelo que previa a política PEPS.
O estudo desenvolvido com esse modelo teve o objetivo básico de avaliar como os diferentes tipos de chegada afetam o desempenho desse terminal, especialmente com relação à tancagem necessária. Para isso, foram assumidos diferentes tipos de premissas com relação às chegadas: chegada constante, gama e exponencial. Na constante, os navios chegam sempre com um intervalo predeterminado. Na gama, foram utilizados diferentes coeficientes de variação, a fim de avaliar o impacto de uma menor previsibilidade das chegadas nas tancagens. Por fim, a distribuição exponencial, que é uma das mais utilizadas para representar tempos entre chegadas aleatórias, permitiu a simulação dos comportamentos dos tanques e filas com um coeficiente de variação igual a 1, valor considerado bastante elevado na literatura.
Tendo sido definidas as distribuições e as prioridades, foram modelados e simulados quinze diferentes cenários. A implementação do modelo foi feita no software Arena e para cada cenário foram rodadas 30 replicações de dois mil dias de duração. Esse procedimento de replicações é necessário para garantir a validade estatística dos resultados e permitir uma análise multivariada posterior.

Referências
Alderton, P .. Port Management and Operations, Third Edition. London: Informa, 2008, pp. 116-117. Asperen, E. V .; Dekker, R .; Polman, M .; Arons, H. S .. Allocation of Ships in a Port Simulation. 2003b. Proceedings of the 15th European Simulation Symposium IBSN: 3-936150-29-X (CD), 2003. Asperen, E. V .; Dekker, R .; Polman,
Autoria: Laura Gonzaga* e Peter Wanke **
Data: 01 de novembro de 2009
Publicação original: CLIQUE AQUI
Publicação no acervo FuMTran: CLIQUE AQUI
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(*) Assistente de pesquisa do COPPEAD/UFRJ
(**) Professor do COPPEAD/UFRJ e sócio fundador do Instituto AILOS