Gilson Machado Neto – Os rumos do turismo rodoviário

 

Publicada originalmente na Revista ABRATI n° 110 – abril de 2022

 

Natural de Recife (PE), Gilson Machado Neto, além de diretor-presidente da Embratur, também foi Coordenador do Grupo Temático do Turismo durante a transição para o governo do presidente Jair Bolsonaro e secretário nacional de Ecoturismo do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Antes de deixar a pasta, o Ministro concedeu entrevista à Revista Abrati, na qual posiciona os rumos do turismo no País e as estratégias do governo federal para melhoria da estrutura rodoviária brasileira.

Revista Abrati | O Ministério do Turismo lançou recentemente uma publicação com indicadores de tendências para o turismo em 2022. Quais os principais pontos a ressaltar neste estudo?

Gilson Machado | A edição de fevereiro da Revista de Tendências do Turismo do Ministério do Turismo traz entre os destaques do setor a redescoberta do turismo doméstico, incluindo o turismo de proximidade, ou staycation, que se caracteriza por viagens para perto de casa, com deslocamentos de até 300 km. Nesta linha, o turismo rodoviário ganhou força, assim como viagens com outros meios de transporte, como o caravanismo. Destinos de natureza, cicloturismo e viagens seguras, do ponto de vista da biossegurança, também aparecem em alta. A implementação de medidas de saúde e higiene por parte dos prestadores de serviço é um fator determinante na hora dos consumidores escolherem por qual empresa ou para qual destino viajar. Além disso, destinos e empreendimentos que investirem em modelos de negócios que privilegiam a comunicação digital e propiciam o mínimo de contato direto entre as pessoas – a chamada Low Touch Economy – também saem na frente na preferência do consumidor. Empresas que souberem oferecer experiências únicas aos turistas terão vantagem competitiva na retomada do turismo.

RA | Dos 25destinos em destaque, vinte são atendidos pelo ônibus que sai de rodoviárias. Esse modal pode ajudar a democratizar o acesso a certos destinos?

GM | Sim, o governo federal vem trabalhando para estimular o desenvolvi- mento de todos os modos de transporte no Brasil. O setor aéreo, por exemplo, está avançando bastante, mas, pela expansão geográfica do nosso País, a malha aérea ainda não alcança determinados destinos. Com isso, o modal rodoviário se torna essencial para o turismo nacional, para a conectividade dos destinos, além, é claro, da acessibilidade do custo da viagem.

RA | O Ministério já vislumbra iniciativas conjuntas para melhorar a experiência do viajante que escolhe este modal?

GM | O governo do presidente Jair Bolsonaro vem realizando grandes entregas em infraestrutura rodoviária, melhorando a trafegabilidade e atraindo investimentos privados por meio de concessões. O Ministério do Turismo também atua com aportes para infraestrutura turística, requalificando vias de acesso a aeroportos e pontos turísticos de diversas cidades. Desde 2019, já foram celebrados contratos na ordem de R$ 330 milhões para obras do tipo. Além disso, vislumbrando o aumento da demanda por viagens domésticas, especialmente pelo modal rodoviário, o Ministério do Turismo criou o Fórum de Mobilidade e Conectividade do Turismo (Fórum MOB-Tur), que discute e propõe políticas e estratégias para aperfeiçoar a mobilidade e a conectividade turística no Brasil, contando com a participação de autoridades e técnicos ligados à mobilidade e à conectividade turística e promovendo a coesão das ações e programas.

RA | Como o Fórum de Mobilidade e Conectividade vem contribuir para a otimização do turismo interno?

GM | Uma das vertentes do Fórum é o Grupo de Trabalho de Caravanismo e Ponto de Apoio ao Viajante (PAV). O objetivo é desenvolver políticas para estruturar áreas de apoio aos turistas nas rodovias, incentivar o caravanismo e discutir, entre outros assuntos, tributação, legislação, desenvolvimento econômico local, além do mapeamento de pontos turísticos que possuem áreas de apoio a esses viajantes. O grupo tem debatido medidas que tornem a viagem uma experiência turística mais positiva, uma vez que percorrer por vias terrestres dá a chance ao turista de conhecer belezas naturais e culturais ao longo do caminho. Em março, o MTur e o Laboratório de Transportes e Logística da Universidade Federal de Santa Catarina apresentaram o diagnóstico da infraestrutura de transportes das trinta rotas turísticas estratégicas do Brasil, contempladas no programa Investe Turismo. A iniciativa possibilitará o planejamento de melhorias no transporte turístico de passageiros no País. O documento reúne um mapeamento dos modais rodoviário, ferroviário, aquaviário e aéreo de cada rota, localizados nas cinco regiões do Brasil.

RA | Poderia exemplificar o que está sendo pensado para as rodoviárias brasileiras?

GM | Realizamos a visita in loco a terminais rodoviários de algumas cidades dessas rotas turísticas estratégicas. Verificou-se a oportunidade para que sejam adotadas ações governamentais para melhorar a infraestrutura e os serviços desses ambientes. Na maioria desses ativos não existem estruturas voltadas às necessidades dos turistas, como centros de atendimento. A exemplo dos aeroportos, por vezes, o terminal rodoviário é o cartão de visitas do destino turístico. Um ambiente acolhedor e de utilidade para o turista certamente ajudará a melhorar a experiência do viajante.

RA | Como o ônibus rodoviário de linhas regulares pode contribuir para o estímulo da viagem turística?

GM | Por meio da Secretaria Nacional de Atração de Investimentos, Parcerias e Concessões, o Ministério do Turismo tem contribuído com a construção do novo marco regulatório do transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, sob a responsabilidade da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Entende-se que a revisão do marco possibilitará tornar mais atrativas as viagens de ônibus em todo País, pois modernizará e flexibilizará a prestação de serviços, tornando mais aderente aos interesses e necessidades dos turistas. Portanto, a expectativa é de que cresça a quantidade de viagens de ônibus por motivo de turismo e lazer. Com esse horizonte de novo mercado, é importante que cresça a sinergia entre os representantes dos setores de transporte rodoviário e de turismo. Nessa linha, rotas turísticas podem ser estabelecidas, visando proporcionar um conjunto de atributos favoráveis e que atendam às expectativas de turistas. Além disso, avaliar pesquisas de satisfação do usuário é um bom meio para buscar atender aos desejos dos clientes e conhecer o perfil desse público.

RA | O Ministério teria alguma recomendação para as empresas do setor sobre como receber este viajante?

GM | É importante mostrarmos ao viajante que as viagens rodoviárias não são apenas um meio para se chegar a um destino. A própria viagem pode e deve ser a motivação desse viajante. O Brasil possui seis biomas, mais de 8 mil km de costa, montanhas, vales, planícies, enfim, paisagens incríveis, que merecem ser valorizadas durante as viagens. Além do percurso, que pode ser melhor explorado turisticamente, as viagens a negócio ou para visitar a família podem se tornar uma viagem turística, tanto no próprio destino quanto para destinos próximos. Um dos objetivos do Fórum MOB-Tur é estudar a viabilidade de integrar os diferentes modos de transporte e interligar as viagens dos turistas, adicionar à viagem de avião, por exemplo, uma outra viagem de ônibus para um destino mais perto e, de lá, uma viagem de trem aproveitando a paisagem e, ainda, um passeio de barco. A riqueza geográfica do Brasil nos permite diversificar a oferta turística e de transportes durante os deslocamentos dos nossos turistas.

 

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